Por Lúcio Castellano - Fonte: FCDL-MG
A FCDL-MG realizou, na manhã desta terça-feira (26/04), a primeira rodada de paineis do Workshop Jurídico Online 2022. O treinamento, promovido pela Federação, é totalmente gratuito e voltado para micro e pequenas empresas associadas às CDLs mineiras. Quem não conseguiu acompanhar a transmissão ao vivo, ainda pode assistir, clicando aqui.

A assessora jurídica da FCDL-MG, Dra. Sara Sato, ao dar as boas-vindas aos participantes, destacou que parte da missão institucional da Federação é promover a capacitação das entidades e dos empresários associados e que, dessa forma, o Workshop Jurídico é uma boa oportunidade de compartilhar e adquirir conhecimento.
Abrindo o primeiro painel, o promotor de justiça de Minas Gerais e coordenador do Procon-MG, Dr. Glauber Sérgio Tatagiba, falou sobre a Lei do Superendividamento e a atual estrutura dos PROCONS e Juizados Especiais Cíveis.
Tabagiba iniciou sua fala destacando uma pergunta crucial para o tema: Quem é o superendividado? A Lei diz que é toda pessoa física, de boa fé, que se encontra impossibilitado de arcar com suas dívidas, sem comprometimento do seu mínimo existencial. Mas quem é o consumidor de boa fé? E o que é o mínimo existencial?
Segundo o promotor, os órgãos que militam em torno da defesa do consumidor já encontram logo no início uma dificuldade de separar o consumidor de boa fé e o que não é de boa fé. “É o primeiro problema que nós enfrentamos na prática. Quanto ao mínimo existencial, de quanto seria? Não se sabe ainda, não se tem ainda uma definição técnica sobre isso”, analisou.
Glauber Tabagiba ressaltou que, por outro lado, a Lei do Superendividamento é mais ampla e não fala apenas de dívidas, trata de inclusão social. “Por isso a diferença de alguém que está superendividado de quem está endividado. Estamos falando de direitos fundamentais, de inclusão. Pela primeira vez vamos tratar da resolução desse conflito, não com relação a uma dívida específica, mas sim em bloco. A questão é da pessoa em si, ela é que tem que ser tratada e não a questão de uma dívida ou outra”, explicou.
Segundo o especialista, o superendividamento das famílias resvala e atinge diretamente os empresários, sobretudo os micro e pequenos. Nesse sentido, a Lei vai trazer um equilíbrio no acerto de um plano de pagamento dessas dívidas do consumidor. “Isso porque aqueles credores que possuem mais condições financeiras, muitas vezes conseguem receber sua dívida, em detrimento do pequeno e médio empresário. Com a Lei, haverá mais equilíbrio, para que tantos os credores maiores quanto os menores recebam suas dívidas em equidade”, afirmou.
Outro ponto destacado por Tabagiba em sua apresentação foi a alteração do art. 54 C do Código de Defesa do Consumidor, que diz respeito sobre a concessão de crédito. O trabalho de prevenção da Lei do Superendividamento prevê a proibição de contratação de crédito de forma irresponsável, sem análise financeira ou de bancos de dados. “Hoje se faz muita confusão entre renda e crédito. Contratação de crédito não faz parte da renda, é uma dívida. Sabemos que a concessão de crédito é importante para movimentar a economia, o comércio, o consumo, mas tem um limite para isso. Esse crédito concedido de forma irresponsável, o consumidor não terá como arcar com o pagamento, vai virar dívida. Sem falar no aumento do número de golpes”, frisou.
Por fim, o promotor falou que Minas Gerais tem sido pioneira na implementação da Lei do Superendividamento, com a inauguração neste mês do PAS – Programa de Atendimento ao Superendividado, que funciona junto ao Procon, por enquanto apenas em Belo Horizonte, mas em breve com expansão para mais cidades. “Através do PAS, o Procon faz a ponte entre o consumidor e o fornecedor, facilita o trabalho desse consumidor para tentar reaver seus direitos e o controle de suas finanças. Ele inclusive será monitorado para não se superendividar novamente”.
Para fechar sua participação, Glauber Tabagiba ressaltou que o Procon está aberto para ouvir também os empresários, para que possam caminhar juntos e tentar diminuir o volume de superendividados da população, de forma a refletir no crescimento econômico.
Antes de passar para o painel seguinte, Dra. Sara Sato chamou a atenção para a questão dos golpes na concessão de crédito irresponsável, que atingem também os empresários, e que é uma queixa recorrente dos associados das CDLs. Tabagiba, por sua vez, comentou que o Procon atende muitos MEIs, que são tratados como consumidores em relação aos grandes fornecedores.
Aplicação da LGPD para ME e EPP
No segundo painel, o advogado Dr. Bernardo Grossi, doutorando e mestre em Direito Privado pela PUC Minas, com experiência em dados pessoais e governança corporativa, falou sobre a aplicação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) para micro e pequenas empresas e empresas de pequeno porte. A mediação ficou a cargo da gerente jurídica da CDL/BH, Dra. Yasmin Mara.
Grossi iniciou sua apresentação destacando que a LGDP é um tema que tem deixado muitas pessoas desconfortáveis por se tratar de uma lei razoavelmente complexa e com muitas obrigações para o empresário. “Apesar de estar vigorando desde setembro de 2020, ainda estamos no processo de amadurecimento e por esse movimento de compreensão sobre a LGPD”, afirmou.
Segundo o advogado, muitas organizações já perceberam que cumprir a LGPD é um diferencial competitivo, pois cuidar dos dados pessoais dos clientes está dentro de um perfil de mudanças contemporâneas às quais as empresas devem seguir que incluem sustentabilidade, transparência, combate à precarização do trabalho, presença on e offline.
Existem pesquisas que provam que os consumidores preferem se relacionar com empresas que têm respeito pelos dados pessoais. Mas, para além de uma tendência de mercado, trata-se de uma Lei e é preciso se adequar a ela, seja eu um varejista, uma entidade associativa ou qualquer outra atividade. Se tenho clientes, estou acumulando informações pessoais desses clientes, assim como dos empregados, fornecedores. “No varejo, o ponto de tensão está no RH/DP e nas práticas de marketing prospectivo”, ressaltou Bernardo Grossi.
“Adequar-se à LGPD não é simplesmente contratar um software, mas sim mudar a nossa mentalidade. É entender que temos processos organizacionais que precisam se adequar a esses critérios da Lei”.
O advogado citou alguns casos notórios de empresas que foram processadas pelo uso indevido de informações pessoais dos clientes, como Drograria Araújo, Netshoes, entre outros. E ressaltou que as indenizações do judiciário por descumprimento da lei podem chegar a R$ 10 mil, sem falar nas indenizações por dano moral coletivo, com cifras bem mais altas. “E ainda tem a responsabilidade administrativa, pois na estrutura criada pela LGPD existe um órgao de fiscalização que também pode aplicar multas de até 2% do faturamento da empresa”.
Em seguida, Grossi chamou a atenção para o fato de que os agentes de tratamento de pequeno porte (empresas de pequeno porte, microempresas e sturtups) têm tratamento diferenciado na LGPD, de acordo com a Resolução nº 2. “Elas estão isentas de várias obrigações, mas não de cumprir a lei. Apenas o rigor e os detalhes são menores, por exemplo, elas não precisam indicar a figura do Encarregado pelo tratamento de dados pessoais, mas tem a obrigação de ter um canal de comunicação ostensivamente divulgado, como o linktree do instagram”, explicou.
O painel prosseguiu com a abertura para a seção de perguntas dos participantes. Uma delas foi se uma empresa pode passar referencias de um cliente para outra empresa. Dr. Bernardo frisou que é preciso sempre consultar o artigo 7º da Lei sobre os tipos de autorizações permitidas. Nesse caso, o especialista afirmou que não é permitido, pois os dados coletados foram para uma finalidade específica naquele estabelecimento e não pode ser desviado para outro fim, isso configuraria violação da LGPD.
É fato que o tema gera muitas dúvidas, como destacou Dra. Yasmin, e poderia seguir com o bate-papo o dia todo. Dessa forma, Dr. Bernardo prosseguiu respondendo as dúvidas diretamente no chat. O especialista indicou como consulta o site da Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD), que dispõe de algumas publicações orientativas, como o Guia de Segurança da Informação para Agentes de Tratamento de Pequeno Porte, que pode ser acessado gratuitamente clicando aqui.
Além do Checklist de Medidas de Segurança para Agentes de Tratamento de Pequeno Porte, disponível neste link.
As MPs 1108 e 1109: principais cuidados para as empresas
Encerrando a manhã do primeiro dia do Workshop Jurídico, o advogado Dr. Ricardo Moreira, especialista em Direito do Trabalho e sócio do escritório Moreira dos Santos Advogados Associados, falou sobre as MPs trabalhistas 1108 e 1109. A mediação ficou a cargo do assistente jurídico da FCDL-MG, Dr. Ricardo Reis.
O advogado explicou primeiramente sobre a MP 1108, começando pela obrigatoriedade do auxílio alimentação, que determina que ele seja destinado exclusivamente ao pagamento de refeição em restaurantes ou de gêneros alimentícios comprados no comércio.
“Tal medida visa impedir que o auxílio seja destinado à aquisição de produtos não relacionados à alimentação. A medida provisória também proíbe as empresas de receber descontos na contratação de empresas fornecedoras de tíquetes de alimentação. Hoje, alguns empregadores têm um abatimento no processo de contratação”, explicou.
Ricardo Moreira ressaltou que para coibir o uso inadequado do auxílio-alimentação pelos empregadores ou pelas empresas emissoras dos tíquetes, a MP prevê multa entre R$ 5 mil a R$ 50 mil, aplicada em dobro em caso de reincidência ou embaraço à fiscalização. “O estabelecimento que comercializa produtos não relacionados ao auxílio-alimentação e a empresa que o credenciou sujeitam-se às mesmas multas”, frisou.
Já com relação à regulamentação do teletrabalho, o objetivo da MP é aumentar a segurança jurídica dessa modalidade de trabalho. “Ela veio para aperfeiçoar uma situação que o Direito ainda tinha poucas situações abordando o tema, de forma muito superficial, e o teletrabalho acabou ganhando muito destaque em face da pandemia de Covod-19″, afirmou.
A norma define teletrabalho (ou trabalho remoto) como a prestação de serviços fora das dependências da empresa, de maneira preponderante ou híbrida, que, por sua natureza, não pode ser caracterizada como trabalho externo.
O advogado ressaltou que entre as regras que foram inseridas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) estão que o teletrabalho deverá constar expressamente em contrato individual de trabalho; o contrato poderá dispor sobre os horários e os meios de comunicação entre empregado e empregador, desde que assegurados os repousos legais; trabalhadores com deficiência ou com filhos de até quatro anos completos terão prioridade para as vagas em teletrabalho; a presença do trabalhador no ambiente de trabalho para tarefas específicas, ainda que de forma habitual, não descaracteriza o trabalho remoto; ao teletrabalhador que reside em localidade diversa da sede da empresa será aplicada a legislação e os acordos coletivos da região onde vive; e o regime de trabalho também poderá ser aplicado a aprendizes e estagiários.
Já com relação a MP 1109, o especialista afirmou considerá-la uma medida atípica, inócua, com duas situações muito próprias, que inviabilizam a aplicação dela nesse momento e possivelmente não será aplicada por ninguém. “Ela prevê a necessidade de estarmos em estado de calamidade pública. A pandemia vem diminuindo, estamos longe daquele quadro crítico de um ano atrás, inclusive o estado de calamidade pública já foi revogado pelos governos federal e estadual”, pontuou.
A MP 1109 também traz medidas previstas para o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, como a suspensão temporária do contrato de trabalho mediante acordo com pagamento do Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda (BEm). “De maneira geral, a MP, institui regras de exceção que visam a preservação do emprego e renda, possibilitando que as empresas consigam manter seus colaboradores durante épocas de calamidade. São medidas trabalhistas com prazo de validade para serem cumpridas”, ressaltou.
Paineis prosseguem nesta quarta-feira
O Workshop Jurídico prosseguiu sua programação nesta quarta, com mais três paineis:
8h30
Painel 4
A Reforma Tributária e as controvérsias do Simples
Expositor: Dr. Valter Lobato – Professor da UFMG, Advogado do escritório Sacha Calmon & Misabel Derzi
Mediadora: Dra. Cleonilda Santos Ferreira – Diretora Jurídica da CDL Uberaba
10h
Painel 5
As principais demandas judiciais contra empresas relacionadas ao SPC
Expositor: Dr. Thiago Antunes – Assessor Jurídico da CDL Itaúna
Mediador: Dr. Rafael Romanos – Advogado CDL Conselheiro Lafaiete
11h30
Painel 6
Bate papo jurídico com as CDLs
Expositores: Sara Sato e Ricardo Reis – Jurídico FCDL-MG
Lembrando que a participação é gratuita e a transmissão acontece pelo Youtube da FCDL-MG.
Clique aqui para assistir.