Uma criança assiste à televisão no sofá da sala. Nos intervalos do desenho animado, comerciais agitados se revezam. Um deles, de um biscoito colorido, chama a atenção do pequeno. Imediatamente, o pai é solicitado a atender ao novo desejo da criança. Se sentindo culpado por não poder passar tanto tempo quanto gostaria com seu filho, corre para compensar sua ausência com biscoitos. A criança come satisfeita, já pensando no próximo pedido.(...)
Mas críticas a este processo são frequentes. Dizem que gera consumismo, obesidade, entre outros males. De fato, a obesidade infantil é um problema crescente. A valorização do consumo como forma de expressão da identidade também. E a causa de tudo isso tem sido atribuída à publicidade. A solução parece simples: proibir a publicidade direcionada à criança. É o que alguns defendem.
Dizem que todo problema tem uma resposta simples, clara e... errada. Me parece ser o caso aqui. No exemplo acima, devemos considerar vários pontos. O que não é saudável à criança não é o consumo eventual de biscoitos, mas seu consumo excessivo.(...)
Se o produto anunciado pode causar malefícios, ele deve ser o principal objeto de mudança. As empresas devem oferecer alimentos sem excesso de açúcar, sódio ou gordura saturada. E ainda devem orientar para o consumo moderado. Se não o fizerem, poderão perder vendas futuras.(...)
A criança já é protegida hoje de possíveis excessos das empresas por uma série de normas e regulamentações: Código de Defesa do Consumidor, Estatuto da Criança e do Adolescente, Conar, Anvisa... Como se não bastasse, há projetos de lei bem mais radicais em trâmite. O PL 5921/2001 propõe simplesmente a proibição de toda publicidade direcionada à criança, apesar de seu teor ter sofrido várias modificações durante estes 10 anos em que passa de comissão em comissão.(...)
A publicidade de produtos que a criança consome tem sido tratada por certos setores como a de cigarros ou de bebidas alcoólicas. É uma postura perigosamente radical. Busca tirar dos pais a possibilidade de escolha. O código de autorregulamentação publicitária já orienta que "nenhum anúncio dirigirá apelo imperativo de consumo diretamente à criança", que não deverá "impor a noção de que o produto proporcione superioridade ou inferioridade" e que deve respeitar "a ingenuidade, a credulidade e inexperiência" dos menores.
São raros os países que proíbem a publicidade infantil: Canadá (apenas em Quebec, desde 1980), Suécia (desde 1991) e Noruega (desde 1992). Curiosamente, são raras também as próprias crianças nesses países. A população infantil do Brasil, de 44 milhões de pessoas, é maior que a população inteira de todos esses lugares somados. O impacto econômico de uma eventual proibição desse tipo no nosso país seria enorme.
O Estado não deve ter a pretensão de decidir pelos pais o que é melhor para as crianças. E as empresas devem ser responsáveis ao lançar e divulgar produtos direcionados ao público infantil. Melhor que proibição, precisamos de conscientização.
* Arnaldo Rabelo, do Mundo Marketing